COMPARATIVO sumário entre a ATUAL LEI DE LICITAÇÕES (8.666) e o PROJETO DE LEI 4.253/2020

COMPARATIVO SUMÁRIO ENTRE A ATUAL LEI DE LICITAÇÕES

(LEI Nº 8.666) E PROJETO APROVADO (PENDENTE DE SANÇÃO)

Conforme noticiado no site do Senado (https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/12/10/senado-aprova-nova-lei-de-licitacoes), em sessão remota nessa quinta-feira 10, o Plenário do Senado aprovou o Projeto de Lei (PL) 4.253/2020, que cria um novo marco legal para substituir a Lei das Licitações (Lei 8.666/1993), a Lei do Pregão (Lei 10.520/2002) e o Regime Diferenciado de Contratações (RDC – Lei 12.462/11), além de agregar temas relacionados. O texto, relatado pelo senador Antonio Anastasia (PSD-MG), vai agora à sanção do presidente da República.

Não estávamos acompanhando a tramitação e os debates. Em razão da notícia veiculada da aprovação, fizemos a análise que segue. Destacamos que são anotações rápidas e iniciais (passíveis sempre de ajustes e retificações) sobre a comparação dos tipos penais existentes na Lei nº 8.666 e que, acaso sancionado o novo projeto de lei, passarão a integrar o Código Penal, com a revogação da parte penal da lei vigente.

Destacamos que o art. 190 dispõe que:

Art. 190. Ficam revogados:

I – os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei;

II – a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1º a 47 da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial desta Lei“.

Já o art. 191 prevê que “esta Lei entra em vigor na data de sua publicação“.

Como no art. 190, I, há revogação expressa dos tipos penais (que são substituídos por outros, não havendo falar em “abolitio criminis“ geral, mas mera sucessão de tipos penais), a parte penal da lei sancionada será aplicada imediatamente após sua publicação (art. 191). Apenas a parte de procedimentos licitatórios será revogada após dois anos nos termos do inciso II do art. 190.

Vamos ao comparativo então.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 Art. 89.

Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:

Pena – detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único.  Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Frustração do caráter competitivo de licitação

Art. 337-E Contratar diretamente fora das hipóteses previstas em lei ou deixar de observar as formalidades pertinentes à contratação direta:

Pena – reclusão, de 3 (três) anos a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da contratação direta ilegal para celebrar contrato com o poder público.

Observações: houve alteração parcial da redação do tipo, mas, salvo melhor juízo, a incriminação é dos mesmos procedimentos então previstos na legislação. Apenas a pena passou a ser de reclusão, não mais de detenção.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 Art. 90.  Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação:

Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Frustração do caráter competitivo de licitação

Art. 337-F Frustrar ou fraudar, Frustrar ou fraudar, com o intuito de obter para si ou para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação, o caráter competitivo do processo licitatório:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa.

Observações:

Os verbos nucleares são os mesmos: frustar ou fraudar

O crime é formal, não havendo necessidade de comprovação de “dano“.

Mas a pena foi aumentada significativamente, de 2 a 4 anos de detenção para 4 a 8 anos de reclusão. Não cabe ANPP, pena mínima igual a 4 anos.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 –Art. 91.  Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração, dando causa à instauração de licitação ou à celebração de contrato, cuja invalidação vier a ser decretada pelo Poder Judiciário:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Patrocínio de contratação indevida

Art. 337-G Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração Pública, dando causa à instauração de licitação ou à celebração de contrato cuja invalidação vier a ser decretada pelo Poder Judiciário:

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.

Observações: alterou apenas a pena máxima (em tese cabe ANPP)

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art. 92.  Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei:             

Pena – detenção, de dois a quatro anos, e multa.                

Parágrafo único.  Incide na mesma pena o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modificações ou prorrogações contratuais.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Modificação ou pagamento irregular em contrato

administrativo

Art. 337-H Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do contratado, durante a execução dos contratos celebrados com a Administração Pública, sem autorização em lei, no edital da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa.

Observações:

– alterou substancialmente as penas, não cabendo sequer ANPP, pois a pena mínima é igual a 4 anos.

– o parágrafo único do art. 92 não foi reproduzido, mas essa circunstância não impede a responsabilização do contratado, nos termos do art. 29 do CP (e preenchidos os requisitos legais ali previstos)

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art. 93.  Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Perturbação de processo licitatório

Art. 337-I Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de processo licitatório:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.

Observações: alterou apenas a pena máxima (em tese cabe ANPP)

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art. 94.  Devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo:

Pena – detenção, de 2 (dois) a 3 (três) anos, e multa.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Violação de sigilo em licitação

Art. 337-J Devassar o sigilo de proposta apresentada em processo licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo:

Pena – detenção, de 2 (dois) anos a 3 (três) anos, e multa.

Observações: tipologicamente, nenhuma alteração, embora alterado o termo „procedimento licitatório“ para „processo licitatório“.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art.  95.  Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo: Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Parágrafo único.  Incorre na mesma pena quem se abstém ou desiste de licitar, em razão da vantagem oferecida.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Afastamento de licitante

Art. 337-K Afastar ou tentar afastar licitante por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo:

Pena – reclusão, de 3 (três) anos a 5 (cinco) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem se abstém ou desiste de licitar em razão de vantagem oferecida.

Observações: agravadas penas mínima e máxima, mas admissível (só pelo tipo isoladamente visto) em tese o ANPP.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art.  96.  

Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente:

I – elevando arbitrariamente os preços;

II – vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada;

III – entregando uma mercadoria por outra;

IV – alterando substância, qualidade ou quantidade da mercadoria fornecida;

V – tornando, por qualquer modo, injustamente, mais onerosa a proposta ou a execução do contrato:

Pena – detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Fraude em licitação ou contrato

Art. 337-L Fraudar, em prejuízo da Administração Pública, licitação ou contrato dela decorrente, mediante:

I – entrega de mercadoria ou prestação de serviços com qualidade ou em quantidade diversas das previstas no edital ou nos instrumentos contratuais;

II – fornecimento, como verdadeira ou perfeita, de mercadoria falsificada, deteriorada, inservível para consumo ou com prazo de validade vencido;

III – entrega de uma mercadoria por outra;

IV – alteração da substância, qualidade ou quantidade da mercadoria ou do serviço fornecido;

V – qualquer meio fraudulento que torne injustamente mais onerosa para a Administração Pública a proposta ou a execução do contrato.

Pena – reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa.

Observações:

– o inciso I teve redação modificada. Antes previa o meio de „elevação arbitrária dos preços“; agora, dá-se mediante a „entrega de mercadoria ou prestação de serviços com qualidade ou em quantidade diversas das previstas no edital ou nos instrumentos contratuais“;

– no inciso II acresceu-se que a mercadoria deteriorada seja „inservível para consumo ou com prazo de validade vencido“;

– no inciso IV acresceu-se a hipótese de „fornecimento de serviço“, antes inexistente redação nessa forma na lei;

– os demais incisos mantiveram em tese as redações originárias;

– alterou substancialmente as penas, não cabendo sequer ANPP, pois a pena mínima é igual a 4 anos.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art.  97. 

Admitir à licitação ou celebrar contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Parágrafo único.  Incide na mesma pena aquele que, declarado inidôneo, venha a licitar ou a contratar com a Administração.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Contratação inidônea

Art. 337-M Admitir à licitação empresa ou profissional declarado inidôneo:

Pena – reclusão, de 1 (um) ano a 3 (três) anos, e multa.

§ 1º Celebrar contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo:

Pena – reclusão, de 3 (três) anos a 6 (seis) anos, e multa.,

§ 2º Incide na mesma pena do caput deste artigo aquele que, declarado inidôneo, venha a participar de licitação e, na mesma pena do § 1º deste artigo, aquele que, declarado inidôneo, venha a contratar com a Administração Pública.

Observações:

– houve desdobramento da redação originária do tipo do art. 97.

– A admissão à licitação está no caput, com pena maior, agora de 1 a 3 anos e multa (antes era de 6 meses a dois anos e multa). Em tese cabe ANPP.

– A celebração do contrato com empresa ou profissional já declarado inidôneo está previsto no § 1º, com pena bem maior (antes era de 6 meses a 3 anos de detenção, agora com pena de 3 a 6 anos de reclusão). Em tese também cabe ANPP.

TIPO ATUAL

Lei 8.666 – Art.  98. 

Obstar, impedir ou dificultar, injustamente, a inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover indevidamente a alteração, suspensão ou cancelamento de registro do inscrito:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL

Impedimento indevido

Art. 337-N Obstar, impedir ou dificultar injustamente a inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover indevidamente a alteração, a suspensão ou o cancelamento de registro do inscrito:

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Observações: Não há alterações.

NOVO TIPO A SER INSERIDO NO CÓDIGO PENAL (sem previsão similar na Lei nº 8.666)

Omissão grave de dado ou de informação por projetista

Art. 337-O Omitir, modificar ou entregar à Administração Pública levantamento cadastral ou condição de contorno em relevante dissonância com a realidade, em frustração ao caráter competitivo da licitação ou em detrimento da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública, em contratação para a elaboração de projeto básico, projeto executivo ou anteprojeto, em diálogo competitivo ou em procedimento de manifestação de interesse.

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.

§ 1º Consideram-se condição de contorno as informações e os levantamentos suficientes e necessários para a definição da solução de projeto e dos respectivos preços pelo licitante, incluídos sondagens, topografia, estudos de demanda, condições ambientais e demais elementos ambientais impactantes, considerados requisitos mínimos ou obrigatórios em normas técnicas que orientam a elaboração de projetos.

§ 2º Se o crime é praticado com o fim de obter benefício, direto ou indireto, próprio ou de outrem, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo.

DISPOSIÇÃO EXISTENTE NA LEI 8.666

Art. 99.  A pena de multa cominada nos arts. 89 a 98 desta Lei consiste no pagamento de quantia fixada na sentença e calculada em índices percentuais, cuja base corresponderá ao valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente.

§ 1o  Os índices a que se refere este artigo não poderão ser inferiores a 2% (dois por cento), nem superiores a 5% (cinco por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com dispensa ou inexigibilidade de licitação.

§ 2o  O produto da arrecadação da multa reverterá, conforme o caso, à Fazenda Federal, Distrital, Estadual ou Municipal.

DISPOSIÇÃO A SER INSERIDA NO CÓDIGO PENAL

Art. 337-P A pena de multa cominada aos crimes previstos neste Capítulo seguirá a metodologia de cálculo prevista neste Código e não poderá ser inferior a 2% (dois por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com contratação direta.”

Observações:

O montante mínimo de 2% foi mantido, mas não há mais a limitação máxima existente de 5%.

A destinação dos recursos seguem as disposições do Código Penal.

OBSERVAÇÃO FINAL.

Como há muitas disposições mais gravosas em relação ao que previsto nas novas disposições, elas só se aplicarão aos fatos criminosos cometidos após a vigência da lei.

2 thoughts on “COMPARATIVO sumário entre a ATUAL LEI DE LICITAÇÕES (8.666) e o PROJETO DE LEI 4.253/2020

  1. Wilguem Dand Gonçalves Reply

    Quanto a inserção do art. 337-L no CP, que cuida da continuidade normativo-típica do disposto no art. 96 da Lei nº 8.666/93, pode-se sustentar que, além da mudança da qualificação da pena (de detenção para reclusão) e do aumento de seu quantum, a maior repressão contida na nova redação também se verifica em seu maior alcance? Explica-se.

    Pela redação atual do art. 96 da Lei de Licitações, não se alcança a prática de fraudes para a contratação de serviços, porque somente descreve a aquisição de bens ou de mercadorias. Eis a tese do STJ:

    “A fraude na licitação para fins de contratação de serviço não está abrangida pelo tipo penal previsto no artigo 96 da Lei 8.666/1993, uma vez que apresenta hipóteses estreitas de penalidade, não podendo haver interpretação extensiva em prejuízo do réu, à luz do princípio penal da taxatividade”.

    Se sancionado o novo dispositivo, e com sua entrada em vigor, esse ponto cego da legislação estará sanado.

    Realmente, esse aperfeiçoamento da norma penal é bem-vindo.

    Professor, o que penso é plausível?

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