Em decisão publicada no dia de hoje, 30.9.2020, a 5ª Turma do STJ decidiu que:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS
CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ARTIGO 316, PARÁGRAFO ÚNICO,
DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – CPP. REVISÃO DE OFÍCIO DA
PRISÃO CAUTELAR. PROVIDÊNCIA VOLTADA AO JUÍZO QUE
DECRETOU A CUSTÓDIA, NO CURSO DA INVESTIGAÇÃO OU DO
PROCESSO. AGRAVO DESPROVIDO.A revisão de ofício da necessidade da prisão cautelar, a cada 90 dias, conforme previsão do art. 316, parágrafo único, do Código de
Processo Penal – CPP é voltada ao Juízo que decretou a custódia
preventiva, providência que deve ser tomada no “curso da investigação ou
do processo”. Desse modo, não há imposição legal ao Tribunal para
reexame da necessidade da prisão preventiva, quando em atuação como
órgão revisor. Precedente desta egrégia Quinta Turma. Agravo regimental desprovido.
A fundamentação utilizada foi a seguinte:
Não obstante o empenho do agravante, mantenho a decisão agravada por seus
próprios fundamentos.
Cumpre salientar que a revisão de ofício, da necessidade da prisão cautelar, a
cada 90 dias, conforme previsão do art. 316, parágrafo único, do Código de Processo
Penal – CPP é voltada ao Juízo que decretou a custódia preventiva, providência que
deve ser tomada no “curso da investigação ou do processo”. Desse modo, não há
imposição legal ao Tribunal para reexame da necessidade da prisão preventiva,
quando em atuação como órgão revisor.
No mesmo sentido, confira-se recente precedente desta egrégia Quinta Turma:
PROCESSO PENAL. PEDIDO DE
RECONSIDERAÇÃO NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO
DE DROGAS. REAVALIAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR
PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ART. 316, PARÁGRAFO
ÚNICO, DO CPP. INAPLICABILIDADE. RECURSO NÃO
PROVIDO.
- O pedido de reconsideração será recebido como
agravo regimental, diante da ausência de previsão
regimental para a utilização desse instrumento contra
decisão do Relator, bem como em homenagem aos
princípios da fungibilidade recursal e da instrumentalidade
das formas. - Nos termos do parágrafo único do art. 316 do
CPP, a revisão, de ofício, da necessidade de
manutenção da prisão cautelar, a cada 90 dias, cabe
tão somente ao órgão emissor da decisão (ou seja, ao
julgador que a decretou inicialmente). - O caput do art. 316 do CPP, ao normatizar o
tema, previamente dispõe o limite temporal da
providência judicial – “no correr da investigação ou do
processo”. - Seja diante de uma interpretação sistemática
do CPP, seja porque a lei “não contém palavras
inúteis”, conclui-se que a aplicação dos referidos
dispositivos restringe-se tão somente à fase de
conhecimento da ação penal. Isto é, o reexame da
necessidade da prisão cautelar, de ofício, deve ser feito
desde a fase investigatória até o fim da instrução
criminal, quando ainda não se tem um juízo de certeza
sobre a culpa do réu e, sendo assim, com muito mais
razão, o julgador deve estar atento em conferir
celeridade ao feito e em restringir a liberdade apenas
de acusados que representem risco concreto à
instrução criminal, à aplicação da lei penal e à ordem
pública. - Em complementação, ressalta-se que a
observância da referida norma pelos Tribunais de
Justiça e Federais, quando em autuação como órgãos
revisores (grau recursal), inviabilizaria sobremaneira o
trabalho das Cortes de Justiça, cuja jurisdição abrange
inúmeras Varas e Comarcas em todo o país. Outra
questão de ordem prática seria a dificuldade de o
Tribunal recursal se manter atualizado sobre a situação
do réu, ao tempo do julgamento do pedido de
reavaliação, devido ao distanciamento das Varas e
Comarcas de origem, o que poderia ocasionar uma
apreciação equivocada sobre a necessidade da prisão
cautelar. Por exemplo, a fuga do estabelecimento
prisional – fundamento bastante para a manutenção do
encarceramento provisório – poderia ser informada
tardiamente ao Desembargador relator. - Pontue-se, também, que o sistema processual
penal prevê meios de impugnação próprios a serem
dirigidos aos Tribunais, nos casos de coação ilegal à
liberdade de locomoção do réu. Inclusive, nada impede
que a defesa a cada 90 dias, em tempo maior ou menor,
renove nas Cortes de Justiça o pedido de relaxamento
da prisão cautelar por excesso de prazo. Ou mesmo,
pleiteie a revogação da prisão cautelar quando do
surgimento de um fato novo, utilizando-se, dentre
outros, o habeas corpus. - Portanto, a norma contida no parágrafo único
do art. 316 do Código de Processo Penal não se aplica
aos Tribunais de Justiça e Federais, quando em
atuação como órgão revisor. - Agravo regimental não provido (AgRg no HC
569.701/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA
TURMA, DJe 17/6/2020).
Na mesma linha de raciocínio, cito trecho da decisão liminar proferida pela
Excelentíssima Min. LAURITA VAZ, integrante da Sexta Turma desta Corte Superior
de Justiça, nos autos do HC 589.544/SC, DJe 25/6/2020, pendente de julgamento de
mérito:
A Lei n.º 13.964/2019, que deu nova redação
ao caput do art. 316 do Código de Processo Penal e lhe
acrescentou o parágrafo único, dispõe (sublinhei):
“Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes,
revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do
processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem
como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a
justifiquem.
Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão
emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a
cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de
ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.”
Embora em juízo prelibatório e, portanto, provisório,
parece-me que a obrigação de revisar, no prazo
assinalado, a necessidade de se manter a custódia
cautelar é imposta apenas ao juiz ou tribunal que decretar
a prisão preventiva.
Com efeito, a Lei nova atribui ao “órgão emissor da
decisão” – em referência expressa à decisão que decreta a
prisão preventiva – o dever de revisá-la, a cada 90 dias, de
ofício.
Ao meu sentir, a inovação legislativa se apresenta
como uma forma de evitar o prolongamento da medida
cautelar extrema, por prazo indeterminado, sem formação
da culpa. Daí o dever de ofício de o juiz ou o tribunal
processantes declinarem fundamentos relevantes para
manter a segregação provisória.
No entanto, depois de exercido o contraditório e a
ampla defesa, com a prolação da sentença penal
condenatória, a mesma Lei Processual Penal prevê que “O
juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou,
se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra
medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de
apelação que vier a ser interposta” (§ 1.º do art. 387 do
Código de Processo Penal), a partir de outra perspectiva
acerca da culpa do réu e da necessidade da custódia
cautelar.
Assim, encerrada a instrução criminal, e prolatada a
sentença ou acórdão condenatórios, a impugnação à
custódia cautelar –, decorrente, a partir daí, de novo título
judicial a justificá-la –, continua sendo feita pelas vias
ordinárias recursais, sem prejuízo do manejo da ação
constitucional de habeas corpus a qualquer tempo.
Pretender o intérprete da Lei nova que essa
obrigação – de revisar, de ofício, os fundamentos da prisão
preventiva, no exíguo prazo de noventa dias, e em
períodos sucessivos –seja estendida por toda a cadeia
recursal, impondo aos tribunais (todos abarrotados de
recursos e entupidos de habeas corpus) tarefa
desarrazoada ou, quiçá, inexequível, sob pena de tornar a
prisão preventiva “ilegal”, data maxima venia, é o mesmo
que permitir uma contracautela, de modo
indiscriminado, impedindo o Poder Judiciário de zelar pelos
interesses da persecução criminal e, em última análise, da
sociedade.
Salvo melhor juízo do Colegiado, entende esta
Relatora que a exegese jurídica da norma em questão não
pode extrair conclusões que levem ao absurdo. É certo que
quem sofre as agruras da prisão preventiva precisa de
instrumentos processuais eficientes para impugnar
decisões que lhe pareçam injustas. Para tanto, a Defesa
dispõe de farto acervo recursal no processo penal
brasileiro, além da inesgotável possibilidade de se arguir
ilegalidades e atentados ao direito de locomoção pela via
do habeas corpus. Não se pode olvidar, entretanto, que
também coexiste no mesmo contexto o interesse da
sociedade de ver custodiados aqueles cuja
liberdade representem risco à ordem pública
ou econômica, à instrução criminal ou à aplicação da lei
penal.
Ante o exposto, voto pelo desprovimento do agravo regimental.
Respeitosamente não concordamos com o E. STJ até o presente momento.
É entendimento consolidado de que toda prisão até o trânsito em julgado é de natureza cautelar. Inclusive há expressa vedação de que a prisão cautelar seja utilizada como forma de cumprimento de pena antecipada.
Nesses termos, GOSTEMOS OU NÃO, a nova regra abarca TODAS AS INSTÂNCIAS RECURSAIS.
Aspectos de estrutura, de inúmeros processos a serem julgados nas instâncias superiores (ou similares) não podem ser argumentos para afastar o que ficou bem claro na lei: necessidade de revisão das cautelares.
Esgotada a jurisdição de primeiro grau, se houver recurso e não exauridas as instâncias, compreendemos que há “transferência” do ônus de revisão das cautelares às respectivas instâncias.